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Domingo, 06 de Outubro de 2024

Saúde

Cigarros eletrônicos: regulamentação divide indústria, entidades de saúde e senadores

Projeto de Lei que traz riscos à saúde, ameaça o sucesso das políticas de prevenção e controle do tabagismo no Brasil, responsáveis pela redução de 35% no número de fumantes

Benê Barbosa
Por Benê Barbosa
Cigarros eletrônicos: regulamentação divide indústria, entidades de saúde e senadores
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Está em pauta na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal o Projeto de Lei nº 5.008/2023, que visa regulamentar o consumo e o comércio de cigarros eletrônicos, também conhecidos como “vapes”. Atualmente, a comercialização desses dispositivos é ilegal no Brasil, mas a sua venda clandestina tem se proliferado, especialmente entre os jovens, que são os principais consumidores. De acordo com a pesquisa Covitel 2023, pelo menos 4 milhões de brasileiros já fizeram uso de cigarros eletrônicos.

A proposta, que divide opiniões, coloca a indústria do tabaco e entidades de saúde em lados opostos. Enquanto a indústria apoia a regulamentação, sob o argumento de que ela permitirá maior controle e arrecadação, além de gerar empregos, as entidades de saúde e diversos senadores se posicionam contra, alertando para os graves riscos à saúde pública, especialmente entre os jovens.

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O Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) alerta o Congresso Nacional sobre os riscos do PL. A legalização é uma ameaça às bem sucedidas políticas de prevenção e controle do tabagismo no Brasil, que reduziu em 35% o número de fumantes desde 2010. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que o tabaco seja responsável por mais de 8 milhões de mortes anuais, estando o tabagismo fortemente associado ao aumento do risco de câncer, respondendo por até 90% dos casos de câncer de pulmão.

O comércio, importação e publicidade de dispositivos eletrônicos para fumar é proibido pela Anvisa desde 2009 (RDC 46/2009).  Em abril de 2024, a Resolução da Anvisa 855/2024 ampliou a proibição, abrangendo a fabricação, transporte, distribuição e armazenamento desses produtos. Não há níveis seguros para o consumo.

O uso de cigarros eletrônicos pode resultar em uma intoxicação significativamente maior em comparação ao uso de cigarros convencionais. Enquanto no Brasil o cigarro tradicional é limitado a 1 mg de nicotina por unidade, os dispositivos eletrônicos, como os “vapes”, podem conter até 57 mg de nicotina por mililitro de líquido. Além disso, o uso de cigarros eletrônicos tem sido associado a um aumento no risco de iniciação ao consumo de cigarros tradicionais entre crianças e jovens.

 

Apesar dos riscos comprovados, a indústria dos cigarros eletrônicos tem adotado estratégias de marketing que confundem a população e buscam, sobretudo, atrair o público jovem. Pequenos e com aparência similar a pen drives, esses dispositivos recebem adição de aromas e sabores agradáveis e são apresentados como produtos de baixo risco. Essa estratégia repete a tragédia do passado, quando o marketing de cigarros “de baixos teores” e “lights” foi utilizado pela indústria para minimizar os riscos comprovados e atrair novos consumidores.

O Brasil está entre os países mais avançados no combate às mortes e doenças causadas pelo tabaco. O país lidera a região das Américas em iniciativas voltadas à redução da interferência da indústria do tabaco, à regulamentação de produtos e à coordenação da vigilância, conforme dados da plataforma de monitoramento da Convenção-Quadro da Organização Mundial da Saúde (OMS) para o Controle do Tabaco. O Cofen se posiciona contra retrocessos em nossas políticas de saúde pública.

Argumentos favoráveis à regulamentação

A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), autora do projeto, argumenta que a regulamentação permitirá um controle mais eficaz do comércio e do consumo de cigarros eletrônicos, combatendo o mercado ilegal e protegendo potenciais consumidores, em especial crianças e adolescentes. O senador Eduardo Gomes (PL-TO), relator da matéria, compartilha dessa visão, destacando a ineficácia da proibição vigente e a necessidade de um marco regulatório para evitar a proliferação de produtos adulterados. Segundo ele, “as pessoas continuarão utilizando e comprando esses dispositivos, e por isso é imprescindível uma regulamentação adequada”.

Outros defensores do projeto, como o senador Dr. Hiran (PP-RR), que é médico, enfatizam a importância de campanhas de conscientização semelhantes às realizadas contra o tabagismo tradicional e defendem que a tributação sobre esses produtos seja direcionada ao Sistema Único de Saúde (SUS), já sobrecarregado pelo tratamento de doenças relacionadas ao uso de nicotina.

Argumentos contrários à regulamentação

Por outro lado, senadores como Zenaide Maia (PSD-RN), Eduardo Girão (Novo-CE) e Humberto Costa (PT-PE) alertam para os riscos que a liberação dos cigarros eletrônicos representaria à saúde pública. Eles argumentam que a regulamentação pode estimular o consumo entre jovens, aumentando a incidência de doenças graves, como o câncer de pulmão, o que geraria mais custos ao SUS. Além disso, destacam que órgãos como a Anvisa e associações médicas em vários países são contrários ao uso desses dispositivos.

A senadora Zenaide Maia, também médica, ressalta que a regulamentação desconsidera os altos custos que o tratamento das doenças provocadas pelo uso de tabaco impõe ao SUS. Estudos indicam que o tabagismo é responsável por cerca de 80% das mortes por câncer de pulmão no Brasil, e os gastos com o tratamento dessa doença, além das perdas econômicas decorrentes da mortalidade precoce, ultrapassam R$ 1 bilhão por ano.

O projeto

O PL nº 5.008/2023, de autoria da senadora Soraya Thronicke, autoriza o consumo, a produção, a comercialização, a exportação e a importação de dispositivos eletrônicos para fumar. Além disso, estabelece diretrizes para o controle, fiscalização e propaganda desses produtos. O texto proíbe a venda ou fornecimento desses dispositivos a menores de 18 anos, estipulando multas que variam de R$ 20 mil a R$ 10 milhões, além de prever pena de detenção de dois a quatro anos para os infratores. A Anvisa proíbe a comercialização, a fabricação e a propaganda desses itens. Essa proibição, no entanto, não se estende ao consumo.

O projeto também exige que os cigarros eletrônicos sejam registrados junto à Anvisa, à Receita Federal, ao Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) e, no caso de dispositivos que possuam tecnologias de comunicação, junto à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Outra exigência é a apresentação de laudo de avaliação toxicológica à Anvisa.

Adicionalmente, o texto incorpora regras semelhantes às aplicadas aos cigarros convencionais, como a proibição de consumo em ambientes fechados e restrições à propaganda, exceto no ponto de venda ou em plataformas de comércio eletrônico que possuam controle de idade.

Atualmente, o projeto está sob análise na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), tendo como relator o senador Eduardo Gomes.

Fonte: Agência Senado (editada)

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